Quem diria que
a jornalista da Globo foi, pelo menos para os militares, uma “perigosa terrorista”. Está tudo
revelado por ela mesma, na entrevista que concedeu ao jornalista Luis Cláudio
Cunha e disponível no site do “observatório da imprensa” (http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed812_a_reporter_pergunta_o_ministro_gagueja). Li “tortura
nunca mais” o livro da arquidiocese de São Paulo que coleta depoimentos
sobre tortura na ditadura e lembro do depoimento de Miriam sobre o uso de
cobras, mas, confesso, não associei o nome à pessoa. Transcrevo a seguir alguns
trechos da entrevista de Miriam:
“Não sei quanto tempo durou esta agonia. Foram
horas. Eu não tinha noção de dia ou noite na sala escurecida pelo plástico
preto. E eu ali, sozinha, nua. Só eu e a cobra. Eu e o medo. O medo era ainda
maior porque não via nada, mas sabia que a cobra estava ali, por perto. Não
sabia se estava se movendo, se estava parada. Eu não ouvia nada, não via nada.
Não era possível nem chorar, poderia atrair a cobra. Passei o resto da vida
lembrando dessa sala de um quartel do Exército brasileiro. Lembro que quando aqueles
três homens voltaram, davam gargalhadas, riam da situação. Eu pensava que era
só sadismo. Não sabia que na tortura brasileira havia uma cobra, uma jiboia
usada para aterrorizar e que além de tudo tinha o apelido de Míriam. Nem sei se
era a mesma. Se era, talvez fosse esse o motivo de tanto riso. Míriam e Míriam,
juntas na mesma sala. Essa era a graça, imagino. Eu com uma barriga de sete
meses de gravidez. O processo, que envolvia 28 pessoas, a maioria garotos da
nossa idade, nos acusava de tentativa de organizar o PCdoB no estado, de
aliciamento de estudantes, de panfletagem e pichações. Ao fim, eu e a maioria
fomos absolvidos. O Marcelo foi condenado a um ano de cadeia. Nunca pedi
indenização, nem Marcelo. Gostaria de ouvir um pedido de desculpas, porque isso
me daria confiança de que meus netos não viverão o que eu vivi. É preciso
reconhecer o erro para não repeti-lo. As Forças Armadas nunca reconheceram o
que fizeram. Minha vingança foi sobreviver e vencer. Por meus filhos e netos,
ainda aguardo um pedido de desculpas das Forças Armadas. Não cultivo nenhum
ódio. Não sinto nada disso. Mas, esse gesto me daria segurança no futuro
democrático do país”.
Talvez
agora, com essa revelação de haver sido presa e torturada pelos bandidos de
1964, Miriam atraia a admiração da esquerda aloprada e seus representantes
parem de associar o trabalho dela a interesses dos “poderosos inimigos do
povo”. Por outro lado, alguns que a admiravam talvez passem a detesta-la em
razão desse seu passado de “terrorista”.
É o preço que se tem de pagar por ter forjado uma personalidade forte, corajosa
e independente. Bem diferente dos bandidos covardes que se escondiam atrás das
fardas e lambiam o chão dos que os financiavam. Bem diferente também de Celso
Amorim, o Ministro da Defesa de Dilma, que também se acovarda e protege os
Militares de hoje que se solidarizam com seus pares torturadores de ontem. São
todos eles cúmplices de crimes contra a humanidade. É preciso que se conte a
verdade para que as novas gerações de brasileiros não continuem sendo ingênuamente
(alguns) enganados pela versão oficial. Revisão da Lei de Anistia, punição
ainda que simbólica para esses bandidos de outrora, e pedido de perdão pelos
militares de hoje, (até para que não pareça que protegem aqueles criminosos e a
eles sejam assemelhados) são medidas que já passarm da hora de serem tomadas em prol do restabelecimeno da verdade. Quanto à Dilma, poderia fazer sua parte em relação à
Miriam e mandar punir exemplarmente os que recentemente tentaram denegrir a
imagem da jornalista alterando seu perfil na Wikipédia. Segundo a imprensa,
esse terrorismo partiu de computadores de pessoas ligadas ao Planalto.
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